quinta-feira, 15 de outubro de 2009


POSSESSÃO

Tivemos recentemente dois bárbaros crimes que comoveram nosso Estado. Um bandido que assassinou duas criancinhas, depois de violentá-las sexualmente, crime sem perdão e sem explicações. Um outro, em que a própria mãe, dizendo-se “possuída” exterminou duas crianças, nesse caso seus dois filhos.

Vivi estranhamente dois sentimentos. Não consigo explicações para o que aconteceu comigo. O primeiro sentimento foi de revolta com o bandido que matou as duas inocentes crianças. O segundo sentimento foi de uma pena enorme da mãe assassina.

Quando no dia seguinte, vi o rosto da mãe (desfigurado) nas cenas do noticiário televisivo, que também apresentava fotos das duas crianças, imaginei também a dor que certamente ela estaria sofrendo. Não dá para entender como uma mãe, em perfeito estado de equilíbrio mental, pudesse vir a cometer tamanha atrocidade.

Lembrei-me de uma ocasião, quando uma pessoa de minha família ligou para mim aflita. Pediu-me que fosse até sua casa porque uma empregada doméstica (já com algum tempo de trabalho) estava possuída pelo demônio. Não sei por que ligou logo para mim. Depois, confidenciou-me que me achando um tanto religioso, poderia atuar naquele caso de “exorcismo”.

Sem saber ao certo com o que ia me defrontar, segui para tentar solucionar esse difícil caso. Lá chegando, deparei-me com uma cena muito estranha. A doce empregada, que sempre me tratava bem e oferecia até umas comidinhas gostosas, estava transtornada.
Caminhado pela sala, assumindo uma postura semiereta, dizia coisas sem muito sentido, e falava com a voz grossa como se fosse de um homem. Ao me avistar foi logo dizendo: “afaste-se de mim roupa branca (naquela época, médico ainda usava branco)”. Tentei acalmá-la pelo convencimento, mas a minha atitude foi nula. Num determinado momento, aquela criatura sempre comportada e respeitosa, começou a dizer palavrões, e de repente (nos seus quase 50 anos e obesa), deu um salto mortal, num curto espaço, e parou na minha frente como se preparando para uma luta.

Não vou contar como a acalmei antes que destruísse a casa (com uma força incrível e agilidade por mim desconhecida e surpreendente), mas a minha estratégia funcionou. Ela acordou como se fosse de um sonho, e logo em seguida ficou totalmente envergonhada da cena vivida.

Não acredito em coisas estranhas, e nem do outro mundo. Não acredito em espíritos do mal e nem em demônios, mas pude presenciar o que a mente humana é capaz de subverter quando acredita nessas coisas. As bruxas existem dentro da gente.

A empregada, depois da crise, ficou muito chateada. Pediu mil perdões e só perdeu o emprego porque a minha familiar ficou com medo dela ter outra crise. Posso dizer que acordou da “possessão” com perdas mínimas.

O mesmo não posso dizer dessa mãe que matou dois lindos filhos. Acredito na sua dor, e por isso não tive em nenhum momento raiva dela, mas muita pena. A dor de “acordar” de um extermínio de dois filhos é mais cruel que a própria morte.