A FAMÍLIA DO SÉCULO XXI
Raquel Moreira
Advogada e psicóloga
A historiadora francesa Michelle Perrot aponta para o fato da família, herdada do século XIX, estar em estilhaço e vir sendo substituída por uma família que tenta conciliar a liberdade individual de seus membros com os “laços afetivos do velho lar”. A família do século XX, e até mesmo aquela da idade média, sempre foi lembrada como referencia de uma família ideal e equilibrada. Mas, será isso, de fato, verdade? Será que era essa a realidade?
TODA SOCIEDADE NECESSITA ADEQUAR A FORMA E ESTRUTURA DE SUAS FAMÍLIAS ÀS SUAS NECESSIDADES ATUAIS.
De um modo geral, a atual sociedade vê a família do século XXI como decadente. Todavia, tal condenação não é de agora. O mesmo já acontecia no século XIX, onde os detentores da moral e da ordem social acusavam a decadência da família por medo da emancipação daqueles que faziam parte da categoria dos oprimidos - entre eles as mulheres, os jovens, e os operários.
A estrutura das famílias atuais apresenta-se muito diferente daquela da idade média, o que, todavia, não significa dizer que a família esteja se “estilhaçando” na atualidade. As mudanças ocorridas nas estruturas familiares devem-se a inúmeros fatores sociais e, entre eles, a própria industrialização.
Com isso, o aumento do número de filhos de pais divorciados e de relações extraconjugais, ou mesmo de famílias onde o papel de pai e mãe são desempenhados por apenas um (na maioria das vezes as mães) é bastante comum. Isso tudo, sem falar no desaparecimento do antigo conceito de filho bastardo e, até mesmo na idéia de que filhos são a finalidade básica de um relacionamento.
QUE TIPO DE FAMÍLIA E CULTURA FAMILIAR A SOCIEDADE ATUAL ESTÁ EM VIAS DE ROMPER?A estrutura da família, herdada do séc XIX, é bastante diferente da família atual e disso não há fuga possível! Aquela era nuclear, heterossexual, monógama e patriarcal.
O pai era o seu chefe, o gerente, a honra e o próprio nome da família. Os interesses desta sempre prevaleciam sobre os de seu integrantes de forma individual. As mulheres e os filhos eram considerados subordinados ao pai chefe da família. As mulheres tinham sua função limitada à fidelidade ao marido e a criação dos filhos e estes, por sua vez, subordinavam-se aos interesses da família, submetendo suas escolhas profissionais e amorosas aos interesses e necessidades da família.
A família era o “refugio caloroso”, a casa protegida pelo muro espesso da vida privada, que ninguém podia violar – mas, também, “secreta, fechada, exclusiva, normativa, palco incessante de conflitos”. Todavia, com o passar dos anos, muitas coisas mudaram. A sociedade se transformou e, com isso, também, a estrutura e forma de existência da família foram modificadas. Por isso, as rupturas vividas pelas famílias atuais são conseqüências de um processo de “dissociação”, iniciado há muitos anos e, ainda, do individualismo dominante no séc XIX e atual.
Assim, a família começou a sofrer o choque externo causado pela efervescência de seus próprios integrantes, deixando de transmitir valores aos seus, sejam eles econômicos, sociais, culturais ou até mesmo simbólicos.
Se não bastasse tudo isso, fatores externos, inerentes a própria evolução social, tentam, ainda, a todo custo, modificar a família tradicional: O avanço da medicina, a tecnologia, a bioética, potencializam cada vez mais o distanciamento dos casais e, conseqüentemente, as modificações nas famílias tradicionais. Paga-se um preço muito alto pelo avanço cientifico e tecnológico! Através da evolução da medicina, por exemplo, um casal poderá ter um filho sem, sequer, se conhecer! E as conseqüências de tais “avanços” para os homens são vantajosas e desvantajosas ao mesmo tempo. E o saldo disso é difícil de se calcular!
O aumento da solidão, que acompanha as separações e as produções independentes de filhos, por exemplo, é uma das desvantagens desses “avanços”. E, no que diz respeito às vantagens, fica a livre manifestação dos desejos de cada indivíduo, na medida em que se questiona quem gostaria de voltar ao velho modelo de família cujas escolhas eram impostas em prol do interesse da família e não do interesse de cada integrante seu. Fica esta questão para reflexão!
MESMO COM TODAS ESSAS TRANSFORMAÇÕES NÃO SE PODE DIZER QUE A FAMÍLIA ATUAL É UMA INSTITUIÇÃO QUE BEIRA A FALÊNCIA!Certamente que não! Essa não é e não pode ser uma instituição desacreditada. Não é a família em si que vem sendo rejeitada, mas, sim aquele modelo assumido no séc XIX, excessivamente rígido e impositivo, onde os desejos individuais eram deixados de lado para fazer valer o desejo da família.
Em tempos como os de hoje, a casa é, e deve ser, cada vez mais, o “asilo inviolável”, o templo e o centro de existência de cada ser humano. O lar deve oferecer conforto, abrigar, proteger, acolher e amparar seus membros.
Busca-se conciliar as vantagens da solidariedade familiar e das liberdades individuais. E é nesse caminho que surgem os novos e atuais modelos de famílias, onde os membros dessa instituição são mais igualitários nas questões que dizem respeito às relações de sexo e idade e mais flexíveis e menos normativistas do que antes.
O que deve ser conservado nesse novo modelo de família são a solidariedade, o respeito, os laços de afeto e, principalmente, o amor!
Resumido por Deonira La Rosa