terça-feira, 1 de maio de 2012

CORREIO MFC BRASIL Nº 284


Espiritualidade e religião se complementam, mas não se confundem. A espiritualidade existe desde que o ser humano irrompeu na natureza, há mais de 200 mil anos. As religiões são recentes, não ultrapassam 8 mil anos de existência.

ESPIRITUALIDADE E RELIGIÃO
FREI BETTO

A
 religião é a institucionalização da espiritualidade, assim como a família é do amor. Há relações amorosas sem constituir família. Do mesmo modo, há quem cultive sua espiritualidade sem se identificar com uma religião. Há inclusive espiritualidade institucionalizada sem ser religião, como é o caso do budismo, uma filosofia de vida.

As religiões, em princípio, deveriam ser fontes e expressões de espiritualidades. Nem sempre isso ocorre. Em geral, a religião se apresenta como um catálogo de regras, crenças e proibições, enquanto a espiritualidade é livre e criativa. Na religião, predomina a voz exterior, da autoridade religiosa. Na espiritualidade, a voz interior, o "toque” divino.

A religião é uma instituição; a espiritualidade, uma vivência. Na religião há disputa de poder, hierarquia, excomunhões e acusações de heresia. Na espiritualidade predominam a disposição de serviço, a tolerância para com a crença (ou a descrença) alheia, a sabedoria de não transformar o diferente em divergente.

A religião culpabiliza; a espiritualidade induz a aprender com o erro. A religião ameaça; a espiritualidade encoraja. A religião reforça o medo; a espiritualidade, a confiança. A religião traz respostas; a espiritualidade suscita perguntas. As religiões são causas de divisões e guerras; as espiritualidades, de aproximação e respeito.

Na religião se crê; na espiritualidade se vivencia. A religião nutre o ego, pois uma se considera melhor que a outra. A espiritualidade transcende o ego e valoriza todas as religiões que promovem a vida e o bem.

A religião provoca devoção; a espiritualidade, meditação. A religião promete a vida eterna; a espiritualidade a antecipa. Na religião, Deus, por vezes, é apenas um conceito; na espiritualidade, uma experiência inefável.

Há fiéis que fazem de sua religião um fim e se dedicam de corpo e alma a ela. Ora, toda religião, como sugere a etimologia da palavra (religar), é um meio para amar o próximo, a natureza e a Deus. Uma religião que não suscita amorosidade, compaixão, cuidado do meio ambiente e alegria, serve para ser lançada ao fogo. É como flor de plástico, linda, mas sem vida.

Há que tomar cuidado para não jogar fora a criança com a água da bacia. O desafio é reduzir a distância entre religião e espiritualidade, e precaver-se para não abraçar uma religião vazia de espiritualidade nem uma espiritualidade solipsista, indiferente às religiões.

Há que fazer das religiões fontes de espiritualidade, de prática do amor e da justiça, de compaixão e serviço. Jesus é o exemplo de quem rompe com a religião esclerosada de seu tempo, vivencia e anuncia uma nova espiritualidade, alimentada na vida comunitária, centrada na atitude amorosa, na intimidade com Deus, na justiça aos pobres, no perdão. Dessa espiritualidade resultou o cristianismo.

Há teólogos que defendem que o cristianismo deveria ser um movimento de seguidores de Jesus, e não uma religião tão hierarquizada e cuja estrutura de poder suga parte considerável de sua energia espiritual.

O fiel que pratica todos os ritos de sua religião acata os mandamentos e paga o dízimo e, no entanto, é intolerante com quem não pensa ou crê como ele, pode ser um ótimo religioso, mas carece de espiritualidade. É como uma família desprovida de amor.

O apóstolo Paulo descreve magistralmente o que é espiritualidade no capítulo 13 da Primeira Carta aos Coríntios. E Jesus a exemplifica na parábola do Bom Samaritano (Lucas 10, 25-37) e faz uma crítica mordaz à religião em Mateus 23.

A espiritualidade deveria ser a porta de entrada das religiões. Antes de pertencer a uma Igreja ou a uma determinada confissão religiosa, melhor propiciar ao interessado a experiência de Deus, que consiste em se abrir ao Mistério, aprender a orar e meditar, penetrar o sentido dos textos sagrados.

*Frei Betto é escritor, autor de Um homem chamado Jesus (Rocco), entre outros livros.

A CHANTAGEM INDECOROSA
HELIO AMORIM – MFC/RJ

O
 senador rei da soja desafiou a presidente da República por todos os canais de TV: “ou devolve para o meu partido o ministério dos Transportes, ou os nossos oito senadores passam para a oposição ao governo”.

O senador não ficou rubro de vergonha nesse também vergonhoso episódio de política suja. Ao contrário, exibia a clássica pose de poderoso defensor do povo brasileiro ao exigir a devolução para o partido do feudo que se transformou no que há de mais sujo na política brasileira ao longo de uma década de corrupção.

Denúncias e crimes financeiros comprovados derrubaram o ministro do partido e toda a cúpula dos órgãos que cuidam ou descuidam das rodovias e ferrovias brasileiras, com dezenas de demissões por ordem da presidente.

O escândalo maior, após o desmantelamento da quadrilha, chegou com esse desafio do senador milionário à presidente. Os oito honestos senadores do partido irão para a oposição se não lhes devolverem o ministério para a recomposição da máfia desarticulada. Não é por discordância com a política, com os programas estratégicos, com as prioridades ou o planos do governo, que eles apoiam e continuarão apoiando se lhes devolverem a chave desse tesouro.

É incrível esses senhores não perceberem a desonestidade explícita dessa chantagem política indecorosa capaz de corar o mais insensível chefe de quadrilha de traficantes ou produtor de pornografia. Porque a cena do senador brandindo as armas foi realmente pornográfica, capaz de justificar uma perda de mandato por mau comportamento e falta de decoro parlamentar.

A presidente deverá prosseguir nessa faxina para manter higiênico o seu governo sem ceder a indecentes chantagens dos personagens de sempre que usam o poder para dilapidar o tesouro de todos. Têm crises nervosas cada vez que parte desse poder de barganhas lhes é retirado.


A PARÁBOLA DO MAR DA GALILÉA
E DO MAR MORTO
PADRE LEANDRO PADILHA

N
a Terra Santa encontramos dois mares bem conhecidos. Embora alimentados pelo mesmo Rio Jordão, eles são, no entanto, totalmente distintos um do outro.

O Mar da Galiléa é de água doce e contém muitos peixes. Seu litoral é salpicado por cidades e belas aldeias. As colinas que rodeiam o mar são férteis e verdejantes.

O outro mar é o Mar Morto. É célebre pela sua densidade de sais minerais. Não tem peixes. Os vegetais não têm condições de vida. Seus arredores são desertos. Não existe área verde. O Mar Morto apresenta aspecto desolador.

De onde vem esta diferença?
A explicação é simples e simbólica.

O Mar da Galiléa recebe pelo norte as águas do Rio Jordão, com toda sua carga de vida e fertilidade. Porém não guarda para si esta fertilidade. As águas seguem seu curso para o sul.

É um mar que recebe a água do Monte Hermon e das colinas de Golan. Riquíssimo em águas e em vegetação, o Mar da Galiléa não vive para si; reparte tudo aquilo que recebe de cima.

O Mar Morto é totalmente diferente. Recebe igualmente a água do Rio Jordão, mas retém esta água para si. Não possui saída. Enquanto as águas se evaporam, todos os sais minerais se acumulam no enorme recipiente fechado. A excessiva saturação é estéril, não permite vegetação alguma, não tem vida.

É um mar que mata. É o Mar Morto.

O Movimento Familiar Cristão (MFC) congrega 8 mil famílias no Brasil e cerca de 100 mil nos cinco continentes. Através dessas famílias cristãs dedica-se a anunciar e lutar por um mundo mais justo e fraterno no qual todas as famílias possam exercer com dignidade a sua missão de formar pessoas e transmitir sua fé, valores humanos e espirituais, denunciando os mecanismos sociais e econômicos que conspiram contra essa construção que Jesus chamou de Reino de Deus. O MFC é de Utilidade Pública Federal e foi reconhecido por Decreto do Vaticano como entidade de fiéis de direito privado a nível mundial.