SITUAÇÃO DRAMÁTICA
Manfredo Araújo de Oliveira*
Este tem em seu centro e como meta fundamental o lucro que na medida em que se faz objetivo exclusivo arrisca-se a destruir a riqueza e produzir a pobreza. Sem dúvida, diz o Papa, o desenvolvimento possui um aspecto positivo que tirou da miséria milhões de pessoas. No entanto o desenvolvimento econômico continua marcado por anomalias e problemas dramáticos que têm impacto decisivo na situação presente e futura da humanidade e da terra.
Pode-se dizer que o cerne deste modelo se revela no fato de que a riqueza mundial cresce em termos absolutos, mas aumentam as desigualdades. Nos países ricos, novas categorias sociais empobrecem e nascem novas formas de pobreza. Nas áreas mais pobres do planeta alguns grupos gozam de uma espécie de superdesenvolvimento dissipador e consumista em contraste inadmissível com situações persistentes de miséria desumanizadora. O "escândalo de desproporções revoltantes" de que falou Paulo VI continua presente em nosso mundo globalizado.
Esta situação dramática mostra com toda clareza que não é suficiente progredir do ponto de vista econômico e tecnológico, mas o desenvolvimento precisa antes de tudo ser verdadeiro e integral, ou seja, estar a serviço da promoção do ser humano e da defesa da terra. Na era da globalização, eliminar a fome tornou-se uma meta a conquistar para preservar a paz no mundo e a subsistência da terra.
O Papa faz neste contexto uma afirmação fundamental para se entender em que horizonte os diferentes temas são tratados aqui: "A fome não depende tanto de uma escassez material, como sobretudo da escassez de recursos sociais, o mais importante dos quais é de natureza institucional: isto é, falta um sistema de instituições que seja capaz de garantir um acesso regular e adequado, do ponto de vista nutricional, à alimentação e à água e também de enfrentar as carências relacionadas com as necessidades primárias e com a emergência de reais e verdadeiras crises alimentares provocadas por causas naturais ou pela irresponsabilidade política nacional e internacional. O problema da insegurança alimentar há de ser enfrentado numa perspectiva a longo prazo eliminando as causas estruturais"...
Foi acentuado por vários comentadores que a tônica do documento é ética. Só que toda ética, se é radical, principia, como faz o documento, com uma análise da realidade humana tanto individual como estrutural e pressupõe uma antropologia. A frase citada revela também a antropologia subjacente ao texto papal, ou seja, a concepção de que o indivíduo humano já está sempre inserido num modo determinado de relacionamento com outros indivíduos que condiciona e determina no mais profundo suas vidas individuais. Compreender o ser humano como um ser essencialmente social e histórico implica compreender que a vida humana é um processo de condicionamento recíproco entre sujeitos e estruturas sociais.
A história humana se revela normativamente, então, como o campo de luta pela efetivação da dignidade humana o que significa efetivação de direitos. Enquanto tarefa histórica isto conduz ao enfrentamento de todo tipo de servidão, uma possibilidade permanente, que constitui a negação de seu caráter de sujeito e de diferentes formas sua redução a coisa. A humanização, portanto, é algo conquistado, o que pressupõe sujeitos ativos e conscientes, autores de seu próprio desenvolvimento, e passa pelo reconhecimento mútuo que se faz pela mediação de estruturas reguladoras da convivência entre sujeitos e sua relação com a natureza no sentido de superar todo tipo de instrumentalização e opressão.
*Doutor em Filosofia, professor da UFC e Presidente da Adital.
Manfredo Araújo de Oliveira*
Este tem em seu centro e como meta fundamental o lucro que na medida em que se faz objetivo exclusivo arrisca-se a destruir a riqueza e produzir a pobreza. Sem dúvida, diz o Papa, o desenvolvimento possui um aspecto positivo que tirou da miséria milhões de pessoas. No entanto o desenvolvimento econômico continua marcado por anomalias e problemas dramáticos que têm impacto decisivo na situação presente e futura da humanidade e da terra.
Pode-se dizer que o cerne deste modelo se revela no fato de que a riqueza mundial cresce em termos absolutos, mas aumentam as desigualdades. Nos países ricos, novas categorias sociais empobrecem e nascem novas formas de pobreza. Nas áreas mais pobres do planeta alguns grupos gozam de uma espécie de superdesenvolvimento dissipador e consumista em contraste inadmissível com situações persistentes de miséria desumanizadora. O "escândalo de desproporções revoltantes" de que falou Paulo VI continua presente em nosso mundo globalizado.
Esta situação dramática mostra com toda clareza que não é suficiente progredir do ponto de vista econômico e tecnológico, mas o desenvolvimento precisa antes de tudo ser verdadeiro e integral, ou seja, estar a serviço da promoção do ser humano e da defesa da terra. Na era da globalização, eliminar a fome tornou-se uma meta a conquistar para preservar a paz no mundo e a subsistência da terra.
O Papa faz neste contexto uma afirmação fundamental para se entender em que horizonte os diferentes temas são tratados aqui: "A fome não depende tanto de uma escassez material, como sobretudo da escassez de recursos sociais, o mais importante dos quais é de natureza institucional: isto é, falta um sistema de instituições que seja capaz de garantir um acesso regular e adequado, do ponto de vista nutricional, à alimentação e à água e também de enfrentar as carências relacionadas com as necessidades primárias e com a emergência de reais e verdadeiras crises alimentares provocadas por causas naturais ou pela irresponsabilidade política nacional e internacional. O problema da insegurança alimentar há de ser enfrentado numa perspectiva a longo prazo eliminando as causas estruturais"...
Foi acentuado por vários comentadores que a tônica do documento é ética. Só que toda ética, se é radical, principia, como faz o documento, com uma análise da realidade humana tanto individual como estrutural e pressupõe uma antropologia. A frase citada revela também a antropologia subjacente ao texto papal, ou seja, a concepção de que o indivíduo humano já está sempre inserido num modo determinado de relacionamento com outros indivíduos que condiciona e determina no mais profundo suas vidas individuais. Compreender o ser humano como um ser essencialmente social e histórico implica compreender que a vida humana é um processo de condicionamento recíproco entre sujeitos e estruturas sociais.
A história humana se revela normativamente, então, como o campo de luta pela efetivação da dignidade humana o que significa efetivação de direitos. Enquanto tarefa histórica isto conduz ao enfrentamento de todo tipo de servidão, uma possibilidade permanente, que constitui a negação de seu caráter de sujeito e de diferentes formas sua redução a coisa. A humanização, portanto, é algo conquistado, o que pressupõe sujeitos ativos e conscientes, autores de seu próprio desenvolvimento, e passa pelo reconhecimento mútuo que se faz pela mediação de estruturas reguladoras da convivência entre sujeitos e sua relação com a natureza no sentido de superar todo tipo de instrumentalização e opressão.
*Doutor em Filosofia, professor da UFC e Presidente da Adital.