A ESTRANHA PEDAGOGIA DO PATINHO
Eu tenho um adorável e estranho amigo. Ele é um cardiologista de destaque nacional e nas horas vagas cultiva uma relação curiosa com os animais. Possui um cachorrinho de estimação (Pipo) que o acompanha no café matinal e senta-se à mesa com ele. Ele tem um especial interesse pelas notícias da televisão e, neste presente momento, está estudando um pouco do idioma inglês. Numa pequena granja que mantém em Atibaia, cria alguns outros animais, entre eles um peru que se chama Pedro Vitor. Cria também alguns cavalos e, de vez em quando, comemora os seus aniversários, com direito a bolos, velinhas e muita animação.
Justifica essa paixão enaltecendo a lealdade dos animais. Nunca estão mal humorados, e tampouco cobram dele alguma coisa. Sempre fazem festa com o mínimo que lhes oferece.
Essa introdução não é certamente para ressaltar apenas as estranhas estripulias de meu amigo. Vou aproveitar do que tenho aprendido com ele para refletir sobre a pedagogia da aprendizagem. Contou-me (ele) a seguinte experiência: havia em sua pequena granja uma grande galinha. Falo grande porque era uma galinha evoluída, daquelas que se presta para determinadas experiências educacionais (sem tremer o bico diante das adversidades). O que aprontou esse meu amigo? Colocou junto com alguns ovos da própria galinha um ovo de pato para ser chocado. A galinha desenvolveu todo o período de preparação para chocar os seus pintinhos, também chocando, sem saber, um ovo de pato.
Decorrido o prazo para a eclosão do ovo, surgem vários pintinhos e um patinho (que não era feio, apenas diferente dos outros pertencentes à mesma ninhada). A galinha, que era uma verdadeira educadora, foi encarando com naturalidade, sem se escandalizar com as diferenças, até porque o patinho ainda era uma criança. Quando a galinha saia para passear e procurar comida levava toda a ninhada. Os pintinhos, por serem também crianças, aceitaram sem nenhuma discriminação o irmão patinho (que, insisto, não era feio, sendo até mais bonitinho e menos peralta que os irmãos pintinhos).
Certo dia, a galinha estava de saída em busca de comida para os filhos, quando resolveu passar por perto de um pequeno lago. O patinho, que de natureza era pato, mesmo sem ter nada de tão diferente dos irmãos pintinhos, resolveu se atirar na água (porque a sua natureza lhe dizia ser de terra e água). A galinha mãe ficou desesperada, e largando os pintinhos (que marchavam tranquilamente na sua retaguarda) lançou-se no lago para tentar salvar o patinho (compromisso de educadora).
Não precisa nem dizer que quem quase morre afogada foi ela, porque sua natureza era a de ser galinha, mãe de pintinhos comportados e não de patinho de natureza apenas diferente.
Faz bom tempo que não encontro esse meu amigo, e nem sei se ele continua fazendo novas experiências. Para mim, essa estranha pedagogia do patinho (que não era feio, insisto) apenas serviu para desenvolver esse lado galinha, capaz de me atirar ao lago, mesmo sem saber nadar, quando percebo que meu filho (embora de outra natureza), não tem a sua criancice entendida e respeitada. Galinha pedagogicamente adequada é aquela que entende de naturezas diferentes, e não a que se satisfaz conduzindo a parte comportada da ninhada.