terça-feira, 4 de dezembro de 2012

CORREIO MFC BRASIL Nº 298



O primeiro passo para compreender e aceitar Jesus como modelo para homens e mulheres de todos os tempos, é compreender e aceitar a sua humanidade verdadeira. Jesus esteve sujeito plenamente às nossas mesmas limitações humanas, tornando-se igual a nós, em tudo menos no pecado. Essa diferença única quer significar que Jesus nunca se colocou contra o projeto de Deus, como o fazemos com infeliz frequência.

JESUS VERDADEIRO HOMEM – PARTE I
HELIO AMORIM – MFC/RJ

J
esus nasceu carente e indefeso, precisando dos cuidados diligentes de seus pais para sobreviver, aprender a andar, a se alimentar, a ler e escrever, como qualquer ser humano. Assim foi desenvolvendo sua personalidade, sob os mesmos impulsos que nos animam. Sua natureza divina se manteve oculta, e em nada interferia em sua natureza humana, como é afirmado, oficialmente no Concílio de Calcedônia.

Esse Concílio se preocupou em deixar isto claro, pois muitos cristãos entendiam a humanidade de Jesus como uma encenação preparada por Deus para fingir-se homem, desempenhando um papel em que as limitações humanas não passariam de mera representação teatral para apenas transmitir uma mensagem ensaiada antecipadamente. Se assim fosse, Jesus não poderia ser modelo para o homem comum.

Não se pode, por exemplo, aceitar que Jesus já nasce predestinado a morrer tão jovem e daquela maneira. Ele próprio não esperava por isso. Só no último ano de sua vida pública começou a ter consciência dos perigos que corria por sua pregação e seus atos. É a partir dessa percepção que ele se torna mais cauteloso, falando por parábolas para que ficasse mais difícil usarem contra ele as denúncias contundentes que fazia em público. Os teólogos se referem a esta guinada na pregação de Jesus como a crise da Galileia.

Era de se esperar que a sua fidelidade à missão de anunciar o Reino, naquele contexto histórico marcado pela injustiça e a opressão política e religiosa, resultasse em perseguição e morte. Mas esse desfecho cruel não era condição para avalizar a sua mensagem. Fomos libertados, não pela morte, mas pela vida de Jesus. Não pelo sacrifício da cruz, mas pela vitória de Jesus sobre a morte, estendida a todos os homens e mulheres de todos os tempos.

Esse é o mistério da redenção. O desfecho histórico poderia ter sido outro. Jesus poderia ter morrido idoso, anunciando e dando sinais do Reino durante uma longa vida, vencendo a morte natural pela ressurreição e encontro com o Pai, destino final de todos os homens e mulheres por Ele criados. Sua morte foi decidida pela maldade dos homens que o condenaram e o executaram quando era ainda jovem.

A cruz foi, portanto um acidente. Não fomos salvos pelo sacrifício da cruz. A cruz era uma possibilidade e risco, mas não condição essencial para a acolhida de sua mensagem após sua morte.

Mas o sentido da cruz é riquíssimo para os cristãos. É a medida da fidelidade esperada de cada cristão no seguimento de Jesus, sem medo de consequências, sem fugas, na adesão sem limites ao projeto humanizador de Deus, implacável contra toda forma de injustiça e opressão.

Esse seguimento implica em atitudes, práticas e denúncias que incomodam os poderosos, resultando em perseguições, incompreensões, perda de privilégios, prejuízos morais e materiais, sofrimento e experiências amargas de abandono e frustração. Jesus sofreu tudo isto, e sofreu de verdade, por ser plenamente homem. Não foi uma encenação. O desfecho não "estava escrito", como fatalidade ou desígnio de Deus. Poderia ter sido diferente. (Continua)
  
OS “ANOS DE CHUMBO” E A COMISSÃO
NACIONAL DA VERDADE - PARTE VI

Rubem Paiva
A Comissão investigará a morte de Rubem Paiva.
Antecipa e confirma seu assassinato pela repressão policial no DOI-Codi.

D
urante mais de quatro décadas, a psicóloga Maria Beatriz Paiva Keller, de 52 anos, não teve qualquer notícia sobre a circunstância do desaparecimento do pai, o ex-deputado federal, engenheiro e empresário paulista Rubens Paiva. Nesta terça-feira, 27/11, ela teve acesso aos primeiros documentos que ajudam a elucidar o mistério e lançam luzes sobre um dos episódios sombrios da repressão.

Os papéis que Maria Beatriz recebeu, em solenidade no Palácio Piratini, na Capital, registram a entrada de seu pai no Departamento de Operações e Informações - Centro de Operações de Defesa Interna (DOI-Codi), na rua Barão de Mesquita, no Rio, em 1971, e um termo de "cautela", datado de 4 de fevereiro do mesmo ano, descrevendo documentos apreendidos no veículo de Paiva. Até então, havia apenas relatos verbais sobre o ingresso de Rubens Paiva no DOI-Codi e as circunstâncias em que ele teria permanecido no quartel-símbolo da repressão.

Os documentos vieram à tona somente agora porque eram mantidos pelo coronel Julio Miguel Molinas Dias, ex-comandante do abominável DOI-Codi. Molinas Dias foi morto neste 1º de novembro, em Porto Alegre, em circunstâncias ainda não esclarecidas.

A POESIA DE RUBEM ALVES

Contei meus anos e descobri
Que terei menos tempo para viver do que já tive até agora...
Tenho muito mais passado do que futuro...
Sinto-me como aquele menino que recebeu uma bacia de jabuticabas...
As primeiras, ele chupou displicentemente...
Mas, percebendo que faltam poucas, rói o caroço...
Já não tenho tempo para lidar com mediocridades...
Inquieto-me com os invejosos tentando destruir quem eles admiram.
Cobiçando seus lugares, talento e sorte...
Já não tenho tempo para administrar melindres de pessoas
As pessoas não debatem conteúdo, apenas rótulos...
Meu tempo tornou-se escasso para debater rótulos...
Quero a essência... Minha alma tem pressa...
Sem muitas jabuticabas na bacia
Quero viver ao lado de gente humana... muito humana...
Que não foge de sua mortalidade.
Caminhar perto de coisas e pessoas de verdade...

O que as pessoas mais desejam é alguém que as escute de maneira calma e tranquila. Em silêncio. Sem dar conselhos. Sem que digam: "Se eu fosse você".

A gente ama não é a pessoa que fala bonito. É a pessoa que escuta bonito. A fala só é bonita quando ela nasce de uma longa e silenciosa escuta. É na escuta que o amor começa. E é na não-escuta que ele termina. Não aprendi isso nos livros. Aprendi prestando atenção.

As palavras só têm sentido se nos ajudam a ver o mundo melhor.
Aprendemos palavras para melhorar os olhos. Há muitas pessoas de visão perfeita que nada veem... O ato de ver não é coisa natural. Precisa ser aprendido! Eu quero desaprender para aprender de novo. Raspar as tintas com que me pintaram.
Desencaixotar emoções, recuperar sentidos.

Amor é isto: a dialética entre a alegria do encontro e a dor da separação. De alguma forma a gota de chuva aparecerá de novo, o vento permitirá que velejemos de novo, mar afora. Morte e ressurreição. Na dialética do amor, a própria dialética do divino. Quem não pode suportar a dor da separação, não está preparado para o amor. Porque o amor é algo que não se tem nunca. É evento de graça.

Aparece quando quer, e só nos resta ficar à espera. E quando ele volta, a alegria volta com ele. E sentimos então que valeu a pena suportar a dor da ausência, pela alegria do reencontro.