sexta-feira, 22 de junho de 2012

CNBB DIVULGA NOTA SOBRE ÉTICA PÚBLICA


A
 Conferência Nacional dos Bispos do Brasil (CNBB) apresentou nesta sexta-feira, 22, uma nota oficial a respeito da ética pública, manifestando indignação e perplexidade da sociedade brasileira diante de fatos políticos e administrativos que contrariam a ética pública e o bem comum.

A nota declara que essa situação chega a colocar em xeque a credibilidade das instituições, "que têm o dever constitucional de combater a corrupção e estancar a impunidade”. Os bispos também lembraram um trecho de um documento da Conferência publicado há 19anos, intitulado ‘Ética, Pessoa e Sociedade'. O documento trouxe um questionamnto sobre o ato de denunciar crimes de desvio de verba pública. “Como não denunciar a grande criminalidade dos que desviam, em proveito pessoal, enormes somas dos órgãos públicos, provocando escândalo e revolta, muitas vezes impotente, da parte dos humildes, a quem estavam destinados esses bens?”.

Quase duas décadas se passaram da publicação desse documento, mas situação continua sugerindo as mesmas preocupações. Na nota os bispos também lembraram que o fato das afrontas ao bem comum acabarem escapando da devida punição acaba contribuindo com o pensamento comum de que a justiça é desigual. “O senso de justiça, sempre presente na consciência da nação brasileira, é incompatível com as afrontas ao bem comum que logram escapar às penas previstas, contribuindo para generalizada sensação de que a justiça não é a mesma para todos”.

LEIA ABAIXO A ÍNTEGRA DA NOTA

NOTA DA CNBB SOBRE
A ÉTICA PÚBLICA

“Ai dos que fazem do direito uma amargura e a justiça jogam ao chão” (Am 5,7)

Fatos políticos e administrativos, que contrariam a ética pública e o bem comum, têm sido fartamente divulgados pela Imprensa, provocando uma reação de indignação e perplexidade na sociedade brasileira. Chega-se mesmo a colocar em xeque a credibilidade das instituições, que têm o dever constitucional de combater a corrupção e estancar a impunidade, que alimenta tal prática.

A Conferência Nacional dos Bispos do Brasil-CNBB, solidária a este sentimento que inquieta a população, vem, através do Conselho Permanente reunido em Brasília de 20 a 22 de junho, manifestar, mais uma vez, sua grave preocupação com estas suspeitas de violação aos princípios da moralidade e da legalidade consubstanciados na Constituição Federal.

Já em 1993 a CNBB questionava: “Como não denunciar a grande criminalidade dos que desviam, em proveito pessoal, enormes somas dos órgãos públicos, provocando escândalo e revolta, muitas vezes impotentes, da parte dos humildes, a quem estavam destinados esses bens? Como não solicitar que os crimes mais graves sejam punidos e que a lei não seja severa apenas com os pequenos infratores, sem jamais atingir os poderosos e espertos? Como tolerar que a um grande número de denúncias comprovadas de corrupção e prejuízo dos cofres públicos não corresponda igual número de punições e ressarcimentos? A impunidade é um incentivo constante para novos crimes e novas violências” (CNBB, Ética, Pessoa e Sociedade, n. 143, 1993).

O senso de justiça, sempre presente na consciência da nação brasileira, é incompatível com as afrontas ao bem comum que logram escapar às penas previstas, contribuindo para a generalizada sensação de que a justiça não é a mesma para todos. Todo cidadão tem o direito à correta gestão de assuntos e serviços públicos, afastando-se a deletéria, porque corrupta, conduta dos governantes de tratar a coisa pública, o patrimônio e negócios públicos, como objetos pessoais postos a usufruto particular e partidário, e à satisfação de caprichos egoístas.

A sociedade brasileira espera e exige a investigação de toda suspeita de corrupção bem como a consequente punição dos culpados e o ressarcimento dos danos. O que temos assistido, no entanto, parece apontar em direção oposta quando muitos fatos, no passado e no presente, ficam sem solução e caem no esquecimento. Isso explica o crescente desencanto da sociedade com as instituições públicas. Os mecanismos que têm a responsabilidade de passar a limpo as corrompidas estruturas do país caem no descrédito e ficam desmoralizados se não cumprem o papel a que se destinam. Nenhum outro interesse pode subjugá-los senão o do resgate da ética no trato com a coisa pública.

Reafirme-se que a força dos três poderes da Repúbica está na sua harmonia, no pleno respeito à sua correspondente independência e autonomia. Os que respondem diretamente por seu funcionamento, no entanto, nunca se esqueçam de que o poder que exercem provém da sociedade.  Da mesma forma, o agente político se recorde de que é seu dever ultrapassar as fronteiras político-partidárias, as condicionantes de oposição-situação, para colocar-se a serviço do Estado e da sociedade, sem confundir jamais o público com o privado, o que constituiria grave ofensa à legislação e desrespeito à sociedade.

No compromisso de construir uma sociedade justa e solidária, inspire a todos a palavra de Jesus Cristo: “Seja o vosso sim, sim, e o vosso não, não. O que passa disso vem do Maligno” (Mt 5,37).

Que Nossa Senhora Aparecida, Padroeira do Brasil, abençoe nosso povo e anime sua esperança!

Brasília, 22 de junho de 2012

Cardeal Raymundo Damasceno Assis
Arcebispo de Aparecida
Presidente da CNBB

Dom José Belisário da Silva
Arcebispo de São Luís do Maranhão
Vice-Presidente da CNBB

Dom Leonardo Ulrich Steiner
Bispo Auxiliar de Brasília
Secretário Geral da CNBB

NEM TANTO - Artigo de Marco Mota



NEM TANTO

E
m meu consultório guardo a imagem de duas santas. Uma é minha mãe que está materializada num retrato preto e branco. A outra é a santa de devoção dela que era Santa Terezinha. Depois de crescido passei a ter também uma devoção especial à mesma santa de minha mãe. Acho que vem das observações que fiz em minha infância, quando por diversas vezes presenciei pela abertura da porta do quarto, as conversas que minha mãe tinha com ela, e a admiração que fui nutrindo em perceber as conquistas que minha mãe obtinha fruto daquelas conversas.

Ainda está gravado em minha memória o gesto de meu irmão Márcio que colocou junto a minha mãe, quando ela baixava à sepultura, o retrato de santa Terezinha que ele guardava dentro de seu quarto.

Durante anos o meu santuário foi crescendo. Os clientes que recebo, percebendo a minha “devoção” vão acrescentando imagens as já existentes. Algumas são curiosas como o meu Santo Antônio da cabeça quebrada. Esse, no dia em que a paciente me levou, sofreu esse acidente e assim permaneceu por muito tempo. Sempre que ela me visitava perguntava por ele, e eu o tirava de um armário para que ele visse que o presente estava valorizado. Até levei um tempo meditando para ver o que aquele fato teria de significado em minha vida. Um Santo Antônio de cabeça quebrada poderia significar que eu deveria fazer alguns reparos na minha conduta. Recentemente a paciente, cansada de me perguntar por ele, resolveu levar para consertar e já o trouxe de volta. Agora, soma-se aos outros santos o meu Santo Antônio que virou o da cabeça colada.

O ultimo presente que recebi foi um padre Cícero, tamanho médio, que nem cabe em meu “santuário”. Desde que o recebi tenho-o mantido guardado na parte de trás de minha mesa de trabalho. O problema é que as pessoas que me levam um novo santo sempre desejam vê-lo em local de destaque no “santuário”. Quando não localizam logo o presente, muitas vezes por está por detrás, se apressam em melhor localizá-lo. Eu sempre me desculpo dizendo que é a pessoa que faz a limpeza quem muda a posição dos santos, afinal eles não se movimentam sozinhos (ainda).

Então, devo estar atento para o dia em que a cliente do meu padrinho Cícero vem para a consulta. Quando vejo que ela está na agenda do dia, apresso-me em colocá-lo numa posição de destaque. Quando ela sai do consultório lá vai de volta o padrinho Cícero para detrás da mesa. A minha sorte é que ele é discreto e fica quieto durante a visita, senão eu ficaria numa situação embaraçosa (ainda não aprendeu a falar).

Em verdade, como o volume cresce dia a dia e tenho recebido muitas promessas de santos novos, meus clientes alimentam uma ideia diferente de minha crença. Por isso digo sempre que tenho apenas duas santas de devoção: minha mãe e Santa Terezinha. E sempre que eles dizem: doutor o senhor é muito religioso, eu lhes repondo: nem tanto.