segunda-feira, 31 de outubro de 2011

OS “CEM VEZES MAIS” PROMETIDOS - Artigo de Dom Henrique Soares


Dom Henrique Soares da Costa
Bispo Auxiliar de Aracaju – SE

Certa feita, Pedro fez uma cobrança a Jesus: “Eis que nós deixamos tudo e te seguimos...” (Mc 10,28). Em outras palavras: “Que receberemos em troca?” O Pescador pensa ainda em recompensa, em vantagens, em um tipo de seguimento a Cristo que renda proveitos quantificáveis com as medidas deste mundo... Parece até aquela gente de certo evangelho torto que mostra a cara e o descaramento na televisão dizendo: “Não tinha nada; entreguei-me a Jesus e agora resolvi minha vida: tenho um carro, duas casas, três fazendas e quatro mulheres...” Aqui não há cristianismo, porque não há Evangelho, não há conversão; tampouco há lógica de discípulo, que só pode ser a lógica do amor desinteressado...

Jesus, paciente, adequa-se a Pedro e responde-lhe que teria cem vezes mais, com perseguições... (cf. Mc 10,29s). O tempo passou... Após a morte e ressurreição do Senhor, Pedro não voltou mais para sua família, não voltou para o seu barco nem para o seu mar; nunca mais lançou as redes para a pesca, nunca mais descansou na sua Galileia natal... Foi-se embora pelo mundo, sem nada a não ser o entusiasmo amoroso por Jesus. Pregou aqui e acolá até chegar a Roma, onde pelo ano 64 foi morto crucificado por causa de Cristo, na colina do Vaticano. Na hora em que a cruz ia ser fincada ao chão, pediu que o madeiro fosse colocado de cabeça para baixo, pois não era digno de morrer como o seu Senhor...

Eis! Não ganhou cem vezes mais em terras, filhos, poder, sucesso... E, no entanto, no momento da cruz, era todo abrasado em Cristo, não se julgando nem mesmo digno de morrer como Jesus...

Onde estava, então, os cem vezes mais, que Jesus prometera? Precisamente nisso: na paz, no gozo interior, na exultação impagável de quem encontrou o tesouro escondido, a pérola de grande valor, o sentido, a razão pela qual viver e morrer. É esta a recompensa para quem tudo deixa por Cristo: aquela paz que o mundo não pode dar nem tampouco retirar, aquela exultação e doçura interior que o mundo sequer consegue imaginar. Era desse “cem vezes mais com perseguições” que Jesus falava e, quando chegou a hora, Pedro pôde compreender.

Queira o Senhor nosso amor e adesão a Jesus não sejam interesseiros, não sejam por cura, carro, casa e problema resolvido e que também nós tenhamos a coragem de tudo ir deixando por ele e, na hora bendita de nossa partida deste mundo, experimentemos a alegria, a plenitude e a paz dos “cem vezes mais” de quem encontrou o tesouro escondido e já experimentou neste mundo o gostinho da vida eterna.