quinta-feira, 13 de setembro de 2012

CORREIO MFC BRASIL Nº 294



HIGIENE NA POLÍTICA
HELIO AMORIM – MFC/RJ


Custa acreditar, mas é verdade. A política não vai mais envergonhar o cidadão, zeloso guardião da ética neste país. A imprensa já se preocupa com a escassez de notícias a partir do ano 2013. Será uma perda importante para a mídia, acostumada com a abundância de malfeitos dos nossos parlamentares e personagens do executivo, com respingos deselegantes nos espaços do judiciário.

N
estes dois anos aconteceram milagres para espanto dos nossos desânimos cívicos. Começaram pelos ministérios, com suas cúpulas herdadas de gestões anteriores, sucessivamente desarticuladas pelo jornalismo investigativo, pelo debate parlamentar e intervenções firmes e prontas da presidente. Ministros e suas cortes se afastaram ou foram demitidos numa sequência alucinante de denúncias e imediatas ações corretivas.

No ministério que cuida das estradas, o diretor geral do departamento que as contrata convocou as empresas que fazem as suas obras para que o conhecido político que renunciou para não ser cassado, “dono” desse setor, explicasse que se aproximavam as eleições e tinha a certeza de que todos os construtores contribuiriam para o financiamento das campanhas do partido que preside. Passou a palavra para o diretor do órgão para que entrasse nos detalhes e se retirou para não se comprometer além da conta. Poucos meses depois dessa exibição de banditismo explícito, o ministro, o diretor e três dezenas de executivos desse ministério estavam demitidos pela presidente. Foi o ponto alto das operações higiênicas que se desenrolaram nesses dezoito meses de cabeças degoladas. O governo está mais leve e transparente, com prestígio e aprovação apreciáveis.

Nas eleições deste ano, teremos a esperada estréia da “ficha limpa”, uma iniciativa popular que, ao ser proposta, muitos céticos não acreditavam ter êxito. Inicialmente no nível dos municípios, com centenas de milhares de candidatos para governos municipais e suas câmaras de vereadores. Milhares já foram cassados antecipadamente: tinham pecados anteriores em suas folhas corridas. O número sempre surpreendente de candidatos foi menor pelo medo dos pretendentes habituais verem sua ficha desvendada pela justiça eleitoral e o consequente dissabor de ler na mídia o seu nome na lista suja. O resultado será um quadro de gestores e legisladores limpos a partir de janeiro. Amém.

Mas haverá os pessimistas que pensarão: depois de eleitos começam os desvios éticos. Pensar na reeleição com prudente antecedência porque a campanha é cara. Estando eleitos, dispõem agora de maior poder para oferecer favores remunerados pelo “caixa dois” de empresas viciadas em benevolências, manobras espúrias em licitações e contratos espertos.

Não será tão fácil, doravante, depois do vendaval do chamado incorretamente “mensalão”, que não foi mensal, mas cotidiano e multimilionário. Quase quarenta réus são exibidos urbi et orbe todos os dias em sessões exaustivas do Supremo Tribunal Federal, instância máxima do judiciário que não admite novos recursos do exército de advogados caros. As sentenças e condenações são definitivas e as punições imediatas. Haverá grades para muitos intocáveis do passado.

Assim, os novos eleitos de ficha limpa não devem cair na tentação dos negócios tradicionais nesse comércio parlamentar, já conhecendo o desfecho certo. A reeleição estará garantida pelo desempenho fecundo e ético do candidato na duração do seu mandato. Sua preocupação principal será demonstrar no dia a dia essas qualidades, em contato pessoal e direto com sua base, nos pronunciamentos corajosos e projetos de lei que apresenta ou apóia com empenho nas tribunas e comissões parlamentares. Serão reeleitos por mérito reconhecido, não pela propaganda e banners espalhados pelas cidades.

Mais dois anos e essa tsunami ética sobe aos níveis superiores, estaduais e federais. O Brasil vai exibir uma face da qual não se envergonhará, dando exemplo destas conquistas em meio aos desvios que explodem mundo afora, em países cuja política é tradicionalmente financiada por grupos econômicos poderosos e ávidos de bons negócios.

Ao mesmo tempo formou-se a Comissão da Verdade que vai desvendar o que ainda permanece oculto das torturas e mortes nos porões da ditadura. A presidente convocou personalidades de reconhecida competência e compromisso ético com a justiça.

Deverá passar a limpo o que ainda se conhece de forma desordenada sobre esse período sinistro. Aqueles “Anos de Chumbo” deixarão manchas eternas na história do Brasil. Que esses horrores jamais voltem a ocorrer em nossa terra.

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