PARA ELEGER
UM
NOVO PAPA
SEM PRESSA
HELIO AMORIM
– MFC/RJ
O
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papa renunciou. O mundo sabe das tensões
internas no seio da Igreja formada por pessoas com suas limitações humanas e
envolvidas no clima intolerável nas disputas de poder nos corredores do
Vaticano que se reflete nas estruturas eclesiais e no povo de Deus mundo afora.
Esse
curto vazio de poder, atípico, não por morte, mas por sofrimento insuportável
do papa idoso ante esse quadro de conluios e vaidades, próprio das cortes
imperiais, acorda os católicos para o que poderá ser um kayrós, tempo propício
para mudanças profundas na vida da Igreja. Ou permanecerá esse clima perverso
pela simples mudança do ocupante do trono em que Jesus jamais aceitaria
sentar-se, cercado por tão imponentes vestes vermelhas.
O
papa deveria ser de fato uma réplica, ainda que imperfeita, de Jesus, sem
poderes imperiais opostos à colegialidade, reconhecido pelos cristãos como
servidor do Povo de Deus, capaz de ouvir os clamores desse povo, sem os filtros
dos cortesãos. Exerceria sua missão no vasto mundo, sem vestuário imponente,
visitaria às vezes o Vaticano, lugar interessante e bem equipado para reuniões
de clérigos e laicos, entendido como sede administrativa de um organismo
disperso pelo planeta, conduzida por funcionários competentes e honestos, sem
uso de símbolos de autoridade divina.
O
papa seria o símbolo da unidade de um extenso corpo de representantes dos
cristãos católicos, talvez formado pelos presidentes das atuais conferências
episcopais nacionais, estes, por sua vez, eleitos democraticamente por
eleitores escolhidos pelos organismos eclesiais intermediários de seu país –
representantes do clero, dos movimentos de leigos e de outros segmentos do povo
de Deus.
Seria
o início de um retorno moderno às práticas do passado, antes da conversão do
povo de Deus ao Império Romano de Constantino, no século IV. Essa conversão foi
fatal. Concílios passaram a ser convocados pelo Imperador romano. Essa rendição
ao poder político está na origem dos desvios da Igreja em relação à inspiração
original dos homens e mulheres seguidores do judeu Jesus de Nazaré.
Os
dirigentes desse contingente já então numeroso de cristãos passaram a vestir-se
como o imperador, adotando seus símbolos de poder, frequentando sua corte e
seus palácios. Esses espaços e símbolos de poder foram aos poucos se
consolidando na adolescência da Igreja, como práticas convenientes e prazerosas
do corpo eclesiástico, agora adotados como súditos do império.
Passados
tantos séculos, esse modelo de Igreja tornou-se anacrônico, não funcional,
distanciando-se da inspiração original, condenado a crises permanentes difíceis
de administrar. Normas eclesiásticas igualmente anacrônicas permanecem
teimosamente na vida da Igreja, em conflito com as demandas de cristãos
adultos, que já não aceitam as bases em que se apoiam suas normas e doutrinas
hoje inconsistentes: questionam-se o casamento sacramental dos divorciados, uso
de medicamentos para o planejamento familiar, celibato obrigatório dos clérigos
impondo um estilo masculino de cuidar da comunidade cristã, a participação
efetiva e plena das mulheres na vida da Igreja, nas funções ainda reservadas
aos homens, a demonização da sexualidade humana, e tantas outras questões de
importância vital para os cristãos.
Na
atual emergência, seria difícil a adoção repentina de uma nova forma, moderna e
revolucionária de ser Igreja, capaz de novamente cativar o povo, especialmente
os jovens. Estes criarão artificialmente a ilusão de sua presença na vida da
Igreja no encontro da juventude com o novo papa no Rio de Janeiro. Será apenas
uma pequena multidão como a dos fogos do ano novo em Copacabana. Prevemos o
esforço para passar a ideia de um “retorno massivo” de jovens para a Igreja.
Eles já estão muito distantes dos espaços religiosos, aqui e especialmente na
Europa. Esse fenômeno do envelhecimento dos cristãos sem jovens para mantê-la
viva, preocupa. Só uma Igreja assumida como sinal dos tempos, com seus valores
originais calibrados para a cultura atual, os trará de volta.
Com
a inesperada renúncia do papa, poderia acontecer uma surpresa igualmente
inesperada, mas certamente possível: a eleição não de um papa de feitio
tradicional, mas de um gestor eclesiástico de transição, com o título próprio
de administrador apostólico ou outro similar, dividindo com um colegiado as
funções e responsabilidades atuais de um papa, com tempo certo e limitado de
gestão, com a missão de conduzir as mudanças que o povo de Deus espera, como um
novo passo do aggiornamento que João XXIII inaugurou há 50 anos, mas parou no
tempo.
A
adoção de uma transição de tempo certo, para consultas, estudos, avaliações,
com metodologias adequadas, não impositivas nem manipuláveis, seria possível. O
Espírito de Deus certamente inspiraria caminhos aos condutores desse processo
que culminaria com a eleição adiada de um papa de novo perfil e missão, em um
concílio de consolidação de todas as mudanças adotadas.
OS ANOS DE
CHUMBO (XI)
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m
desfecho esperado. Carlos Alexandre Azevedo suicidou-se neste fim de semana,
aos 40 anos. Tinha um ano e oito meses quando foi sequestrado e levado para o
DOPS de Sérgio Paranhos Fleury, em São Paulo, onde já estavam presos seus pais,
sob a acusação de dar proteção a militantes católicos de esquerda, em janeiro
de 1974. Foi esbofeteado pelos policiais quando chorava e jogado no chão. Bateu
a cabeça e nunca mais se recuperou. Foi diagnosticado como portador de “fobia
social” e se tornou dependente de antidepressivos e antipsicóticos. As sequelas
do que sofreu na infância se agravaram ao longo da vida. Descansa finalmente em
paz.
A POESIA DE
RUBEM ALVES
Rubem Alves |
"Enquanto a sociedade feliz não chega, que haja pelo menos fragmentos
de futuro em que a alegria é servida como sacramento, para que as crianças
aprendam que o mundo pode ser diferente. Que a escola, ela mesma, seja um
fragmento do futuro..."
Ao final de nossas longas andanças, chegamos finalmente ao lugar. E o
vemos então pela primeira vez. Para isso caminhamos a vida inteira: para chegar
ao lugar de onde partimos. E, quando chegamos, é surpresa. È como se nunca o
tivéssemos visto. Agora, ao final de nossas andanças, nossos olhos são outros,
olhos de velhice, de saudade”.
“É mais fácil amar o retrato. Eu já disse que o que se ama é a ‘cena’.
‘Cena’ é um quadro belo e comovente que existe na alma antes de qualquer
experiência amorosa. A busca amorosa é a busca da pessoa que, se achada, irá
completar a cena. Antes de te conhecer eu já te amava... E então,
inesperadamente, nos encontramos com rosto que já conhecíamos antes de o
conhecer. E somos então possuídos pela certeza absoluta de haver encontrado o
que procurávamos. A cena está completa. Estamos apaixonados”.
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